um weblog sobre literatura, viagens, momentos, poesia, sobretudo, sobre a vida. enfim, um weblog com histórias dentro.

terça-feira, dezembro 31, 2013

13 vs. 14

quero terminar o ano 13 com o que mais gosto de fazer - escrever. espero começar o 14 com o que de melhor sei fazer - escrever. sempre gostei do número 13 {número de sorte, sobretudo espiritual], mas não gostei deste 13. foi um 13 que me desiludiu. com solavancos, e momentos com o trânsito pára-arranca. um novo ano é sempre um amanhã e tudo o que isto significa: limpar pó, lágrimas, arrumar, despachar o que não interessa, uma nova oportunidade a espreitar pelo buraco da fechadura. nós a puxar a maçaneta da porta e deixar entrar a esperança - a fé - desafios - objectivos. por esta ordem. prestar-lhes a cortesia da casa. servir-lhes o melhor de nós. então, chega, mais uma ano, mais um amanhã para nos iludirmos [ou talvez não]. mais a idade avança, menos força na crença, mais tentativa de força na crença. todos os anos elaboro uma lista. do que quero e desejo. percebo no final de cada ano que o que concretizo é mais do que depende apenas de mim do que o que não está totalmente no meu controlo. conclusão: gosto muito de mim. vou apostar mais em mim.

sábado, dezembro 14, 2013

estórias de metro a metro - manjar ou não manjar

ela, mãe, espetou o teste de inglês da filha na cara do pai. a filha encolhia-se até onde podia no banco ao lado da mãe. as palavras da mãe eram confetis no ar. 'ela não manja nada de inglês. se se admite, satisfaz'. a filha de 12 anos num corpo de 14, sorria-se cada vez mais fundo no banco. todos na carruagem ficámos a saber que o inglês não é o forte da garota. o pai fungava risos no lenço que levava ao nariz cada vez que falava. 'manjas tu, querem 'ber'. 'eu na idade dela manjava'. a garota intrometia um 'mas'. mas os pais empurravam lá para dentro do corpo de 14 o 'mas'. e a garota continuava a tentar projetar cá para fora 'mas'. e os pais não manjavam que a filha queria talvez vincar alguma ideia naquele satisfaz de inglês. 'mas', venceu, por fim, a garota, 'tirei excelente a físico-química'. quis-me parecer que toda a carrugem a quis felicitar, aplaudir, festejar o excelente. porque, há uma leve certeza em mim que são poucos os que 'manjam' de símbolos químicos.

segunda-feira, novembro 18, 2013

estórias de metro a metro - o olhar e a violência do destino

mal escolhi o banco para fazer a viagem de metro até campanhã, cruzei o olhar com o olhar infinito e indefinido da senhora no banco à minha frente. tinha os cabelos brancos na raíz e castanho até aos ombros, onde estava apanhado com fios mal presos. trazia uma roupa gasta e triste, uns sapatos de salto gasto e umas rugas que contavam estórias de vida calejada pelo trabalho, pelos desamores, pela violência do destino. os olhos fatigados e o olhar infinito e indefinido. nas mãos levava um saco de plástico e uma carteira preta, sem brio, sem qualidade. e uns brincos. uns brincos presos na cara onde levava um olhar infinito e indefinido. brancos na forma de pérola. foram dados, de certo. herdados, talvez. os brincos não condiziam com o traje gasto, com a pele gasta, com o olhar infinito, indefinido e triste. nisto. nisto, nestes meus pensamentos lavados pelo vazio, pelas avaliações vazias. nisto. a senhora de pele marcada por desamores e violência do destino, olha-me nos olhos, deixa o infinito e o indefinido e escolhe-me a mim para: - estamos em s.bento? - não, aqui é o bolhão, para s.bento deveria ter saído na estação anterior, na trindade. mudava para um outro metro. uma calma invejável. com a serenidade, a maturidade de quem acatou a violência do destino, levanta-se pega no saco sem graça, na carteira podre, arrasta o cabelo para trás, sobressaí a raíz, sobressaem as rugas, sobressaí as unhas mal pintadas que até aqui não tinha notado. diz-me com um olhar definido: - obrigada, não tinha reparado, não me resta se não sair em 24 de agosto. não resta se não. não resta nada. a violência do destino. os quilómetros feitos que permitem andar para trás e para a frente. acertar o olhar para a posição de infinito e indefinido. cruzar a indefinição na confusão de passos, de cabelos bem e mal pintados, na correria. da violência do destino.

terça-feira, outubro 29, 2013

estórias de metro a metro - dos gestos mal-criados.

os dois garotos despem-se até à última brecha da porta do metro. a porta fecha-se. ela sai de cena, ele fica. ele fica e fica também a última imagem que a miúda deixou para ele e para todos os passageiros que estivessem a apreciar o momento. a miúda despede-se com o dedo médio da mão no ar. encolheu os restantes dedos e exibiu o dedo proibido. fez-me lembrar o mister bin. a cena era a mesma. o mesmo dedo. utilizado numa despedida e à descarada. só que. só que estava a senhora de nariz altivo, roupa altamente engomada, sapatos e carteira exemplarmente brilhantes, e a postura rigorosamente alinhada com o varão do metro. - o menino não tem vergonha? o menino teve uma vergonha do tamanho de duas grandes maças vermelhas a crescer-lhe nas bochechas. tanta vergonha que até me fez crer que mal o metro despachou passageiros na estação seguinte, o menino despachou-se a ele mesmo a fugir das próprias bochechas.

quinta-feira, outubro 24, 2013

estórias de metro a metro - dos tacões

ela entrou no metro aos tropeções. primeiro tropeçou num tacão. depois o outro falhou. mesmo à entrada do metro. mesmo à mercê da gargalhada alheia. a miúda com cara pintada de mulher devia ter uns 17 anos. de livros na mão e castigada pela chuva, entrou no metro já corada pelo sucedido - como se ainda estivesse a ensair a personagem para as amigas na escola. tentava trejeitos de mulher, mas quando levava as unhas à boca denunciava a miudeza dos anos. começou a baloiçar os longos cabelos, e os outros passageiros trociam a cara pelo vento e pingos de chuva que saiam da cabeça da miúda-que-tentava-ser-mulher. a vida é muito perspicaz: faz-nos quer ser grandes, quando pequenos, para aguentarmos todas as vezes que os tacões falham, e faz-nos ficar mais meninos, quando velhinhos, para irmos desta, com a sensação de não estarmos cansados por termos levantado tantos tacões.

segunda-feira, outubro 21, 2013

do pão com panado

A senhora rastejava os olhos pelo balcão. Tinha lápis preto nos olhos, parecia já de uma semana. Falava para o marido que estava escondido atrás do balcão, entre pedidos de clientes, com trajes vagabundos cosidos pela própria vida. Tem algo rápido para comer? Sim, menina, responde, olhando-me com os olhos borratados de negro a condizer com o casaco que vestia. Apontou para tudo quanto passou pelas mãos do marido que nunca conheci, pois estava para lá das paredes gastas pelo tempo. ‘Rissóis, pão com panado e omelete’, conta pelos dedos das mãos. Um sorriso brilhava no meio de tanto negro. Pode ser um pão com panado, escolho. A mulher arrasta-se até à mesa. Com o peso do casaco, com o peso do lápis preto nos olhos, com o peso do pão com o panado, com o peso da vida. O dia está correr bem? ‘Nem o dia, nem a vida. A minha filha está desempregada, ganha 500 euros numa loja, e na área dela, em psicologia, arranja trabalho se for voluntário. Um filme’. ‘Um’, não, O filme desta sociedade. Querem mãos, pernas, braços, cabeça, tronco, mais o suor, mais as horas além do dia, o sol e a noite, até a nossa alma. Para quê? Para no fim nem um pão com panado oferecerem em modo de gratidão.

quarta-feira, outubro 09, 2013

estórias de metro a metro - os picas

as mulheres roliças empurraram-se para dentro do metro. traziam sacos, carteiras, mochilas com rodinhas, e sobretudo traziam o próprio peso. suor de um dia inteiro, tatuagens gastas pelo tempo a contar estórias de homens apaixonados de espingarda na mão. falavam como num auditório, muito alto. sobre 'a morcona da mulher do tone que nem um filho da puta de um peixe sabe fritar'. tinham o cabelo manchado de cores. o entusiasmo das duas foi interrompido pela presença dos 'picas'. tantos sacos, carteiras, mochilas com rodinhas e nada de andante. o 'pica' não pôde picar e por isso multou. 'oh foda-se, oh pica, deixe passar esta, é só uma paragem'. 'oh caralho, onde é que você 'tava que num o 'bi'...olhe, se sabia, ia noutro'. o 'pica', um senhor bastante simpático para a linguagem que lhe era dirigida, explicou minuciosamente à mulher roliça mais descontrolada que eram 'as regras'. mas a mulher podia até saber fritar melhor peixe do que a mulher do tone, mas regras não era a sua praia. dizia ela que mal abandonasse o metro ia rasgar o papel da multa e esquecê-la. o senhor 'pica' pediu-lhe 'respeito'. será que é respeito no pagamento das facturas que o país nos anda a pedir há muito tempo? mas será que foi esse o metro que apanhámos sem pagar bilhete?

segunda-feira, setembro 30, 2013

das relações interpessoais

foi há uma semana. o sol ainda existia. estávamos numa piscina. não sabíamos que era a despedida do verão. sentamo-nos em duas cadeiras 'ao calhas'. havia um casal ao lado. vizinho desse dia. não nos encontramos de imediato. havia um guarda-sol entre nós. ficou entre nós o dia inteiro. como diria uma tia: 'chispámos'. como diria o poeta: 'primeiro estranha-se, depois entranha-se'. os miúdos brincaram. aproximaram os pais. reconhecemos os pontos em comum. as relações são estranhas. os seres humanos também. mas existe algo mais valioso: o sangue que corre nas veias, a sensibilidade genuída de saber pelos olhos, as almas que valem a pena. nada é ao acaso. nem palavras ríspidas que terminam num abraço.

terça-feira, setembro 24, 2013

estórias de metro a metro - a música

onde há música há alegria. mas não é tanto assim, quando a melodia sai dos ouvidos de qualquer um no metro. seja manhã, tarde ou noite, há gente e gente com phones enfiados nos ouvidos, a tentar ser invisível ao mundo. só que o que acontece é precisamente o oposto. gente no metro com phones colados nos ouvidos atrai tudo e todos. atrai ainda mais gente. gente que não se importa, gente que curte, gente que não suporta, e gente que bufa. é que a música não lhes fica apenas nos ouvidos. sai de lá de dentro e impregna-se em tudo quanto pode. parece uma daquelas roupas que fica trilhada na gaveta do armário , se não a fecharmos com cuidado. num destes dias no metro, um rapaz ia com a música aos berros nos ouvidos. e dormia. pacientemente. música? o som ia mais ou menos assim: tz, tz, tz, tz. não saia disto. há gostos para tudo. as frases dos avôs fazem cada vez mais sentido. a vizinha, sentada no banco ao lado bufava por todos os lados. mexia-se no assento. mas o rapaz não acordava e a música não se calava. coube-me a missão de tirar o rapaz do mundo dos sonhos. olhou-me de lado. 'será que podias baixar o som, se faz favor', pedi. 'rgghhhrrrgghh', respondeu. a senhora agradeceu com um sorriso. voltou a realidade com a música de todos os dias.

sexta-feira, setembro 20, 2013

da tatuagem

é um grupo grande. 19, mais precisamente. há uma menina que chama a atenção. porque fala assim, né? mas a mim o que me intrigou foi a tatuagem no braço. tem três palavras. e durante três dias não descansei enquanto não consegui decifrar as letrinhas pequeninas. andava em volta feita borboleta. metia conversa. quase me pegava o jeitinho dela falar. até que numa longa passa que ela dava no cigarro, agarrei a oportunidade, li sem ser vista, tirei sem roubar. know your rights agradou-me. até porque se dirigia a mim, e a ti. pensei: não fosse má ideia gravar aquelas palavras na testa. é ridículo mas necessário nos dias de hoje onde se publicam anúncios do género: queres ganhar 300 euros, não te importas de trabalhar 10 horas sem receber extraordinárias, apenas com uma folga semanal. àquela frase eu acrescentaria I DO know MY rights. tatuagens destas deviam sair nos pacotes de batatas fritas, para utilizar em ocasiões especiais - que já são de mais.

estórias de metro a metro - os livros

na carruagem do metro que eu escolho vão sempre pessoas com livros como se fosse filhos. os livros sentam-se no colo, a pessoa está ali mas não está ali. é aqui que a minha curiosidade extravasa. seja homem ou mulher, primeiro agarra o livro como se alguém fosse agente de execução e penhorasse o livro. agarram com força o livro nas mãos, encostam-no à cara como se se tivessem esquecido os óculos em casa, e sempre que algum olho alheio tenta perceber o título ou o autor, o livro, na carruagem como troféu, é imediatamente escondido entre os braços. 'tu põe-te fina, tu nem tentes pegar no livro, tu não olhas o meu livro, o livro é só meu'. é um gesto mimado. escrevia eu que as pessoas que lêem no metro não sabem que estão no metro. navegam. viajam. tornam-se outros. pelos breves minutos que a viagem do metro dura - as mesmas linhas de uma estória qualquer fechada entre duas capas - as pessoas que trazem ao colo um livro não tiraram o andante, mas sim um bilhete além da minha carruagem.

quinta-feira, setembro 19, 2013

estórias de metro a metro - o chinês

8h30. nem isso. olhares de compromisso com a cama - ainda. uns fumam. outros validam à pressa o seu andante para o metro. umas bocas abrem em preguiça, a acordar para a agenda do dia. cada um nos sapatos e fatos seus. cada um na sua vida. umas caras mais felizes do que outras, à espera do metro e do dia. é ali na estação do metro que começa a pressa do dia. é ali que também o relógio boceja pela última vez até alinhar os ponteiros com os olhares dos proprietários. de repente. de repente um homem, de cara chinesa, agarra no telemóvel e fala. põe todo o cenário que sempre arruma aquela hora do dia em sobressalto. os bocejos descoordenam. os relógios desorientam-se. os olhares focam-se. no chinês. que decide falar alto. e, ainda por cima, em chinês. dong ding dong. dong. ding. dong. dong ding dong. aquilo foi um despertador. um motivo. basta um motivo para o dia começar com interesse, com magia, enfim, com uma estória para contar no local de trabalho na hora da pausa. 'sabes hoje ouvi chinês', 'não percebi nada', 'mas o meu dia começou assim', 'da china de ramalde com amor'.

domingo, setembro 15, 2013

estórias de metro a metro - línguas e cores

há um grupo de pessoas que se apodera do quadro com as informações sobre horários e zonas no metro. falam alto. ainda não os tinha visto da escada rolante e já imaginava o cenário: espanhóis, histéricos. aproximei-me do quadro, porque queria saber uma informação. mas esses espanhóis, desde há três séculos que nos querem à força - seja terra, mar, ou o quadro com as informações sobre as linhas do metro. de rompante olham para trás. deparam-se com o meu olhar intrometido, à espera de uma oportunidade de me inflitrar naquela tertúlia sobre para onde vai este e aquele metro. fui presa fácil. apontaram-me os canhões das perguntas: quero ir para aqui, como faço? [sempre em espanhol, claro!] e eu, em português [sempre, claro, por patriotismo, apenas]: é assim, assim, assim. uma verdadeira professora, apontar para o esquema do metro, a explicar tudinho. os ' muchachos' na casa dos 50 anos foram embora e nem um 'gracias'. bem posso viver sem 'gracias'. não o fazia na terra deles, e ainda bem que houve um 1º de Dezembro e o grupo dos Quarenta Conjurados.

da debandada

acordar pela miúda num susto. preparar leite, café, pão, manteiga. comer. arrumar. 'vamos ao parque. vamos ao parque. vamos ao parque.' 'vamos, sim. deixa apenas isto. deixa só aquilo'. 'vamos, vamos, vamos, vamos'. os ouvidos hipnotizam, cansam-se naquele v-a-m-os. é imperativo. é agora. 'ok, eu deixo o vamos para depois, para lá dos ponteiros'. parque. regresso a casa. avental. tachos. lume. miúda a puxar o avental, a fazer um comboio.dançamos todos. eu com o fogão. a miúda comigo. e os tachos ao lume. comemos. arruma cozinha. vamos brincar. vamos brincar. vamos brincar. já percebi que são necessárias três vezes para a informação passar à acção. 'não, agora, descansas, enquanto eu isto e aquilo'. dorme. finalmente, acorda. lava cara. veste. de debandada para o porto. para ver um amigo. o novo livro do amigo que já não via há muito. que falarei adiante aqui no fb. merece um espaço só dele. vemos o livro, o amigo, e outros amigos. pessoas em debandada. em debandada de jantares e concertos. a minha debandada encaminhou-se para casa. sopas. 'bonecos, bonecos, bonecos'. e passar a ferros. terminei a debandada com o novo livro do velho amigo adormecido no meu colo e eu adormecida na almofada. foi a minha debandada do porto. e foi muito cool.

quarta-feira, setembro 11, 2013

Estórias de metro a metro – no Metro

As meninas sentadas atrás de mim falavam muito. Havia, no entanto, uma palavra que sobressaía mais do que as outras. Diziam ‘caralho’. Tantas vezes quantas as que falavam. ‘caralho’ o almoço que fiz correu mal. ‘caralho’ tive de me despachar. ‘caralho’ ele não largava do meu pé. Até que: ‘caralho’ olha aquela ali tem um rabo de cavalo mesmo giro. Tive um igual mas perdi-o. Pensei por ela: ‘caralho’. Por compaixão. Ter-se algo bonito e perder-se. É mesmo fodido. Principalmente para uma gaja que se prese. Continuou a miúda atrás de mim que nunca conheci, a não ser a voz através do ‘caralho’: ‘tem estilo’. E tinha. Esta outra miúda, nos seus 20, entra vitoriosa no metro de vestido cor-de-rosa, de rabo de cavalo. Exibicionista. Parecia saber que alguém, ali, tinha um i-g-u-a-z-i-n-h-o. Mas naquele momento ela era a única. ‘caralho parece a Cleópatra’, comparava a tipa atrás de mim. E parecia. Mesmo. Eu confirmo. Senta-se mesmo à minha frente. Podia ver-me a mim, às outras que nunca vi. Silêncio. Devemos ter todas pensado: que grande ‘caralho’.

terça-feira, setembro 10, 2013

malas, nova iorque e acasos: palmira

os dois miúdos vão agarrados a quatro malas. duas para cada um. o rapaz leva na cabeça um boné que diz new york, a rapariga tem umas unhas enormes e vermelhas de sangue com diamantes colados na ponta da unha. Um decote que dá para imaginar o que lá vai dentro. são miúdos. terão 15? 17? vao aos solavancos, eles e as malas. no metro: sentido/direction, aeroporto. irão sozinhos? para nova iorque (tendo em conta o boné do rapaz? não sei. cochicham um com o outro. nos olhos trazem sono. mas já são 16h. ainda assim sono. viajo para dentro da cabeça daqueles miúdos. percebo que vão para nova iorque, que às tantas conhecem a minha prima. palmira. eu sei disto. eles não. separados por um banco no metro, mas com algo em comum. a palmira. tenho a certeza. tenho tanta certeza nisto. como nos acasos. se os miúdos não tivessem tomado o meu metro, sentado à minha frente, com o boné a dizer new york, nunca poderiam conhecer a palmira. mas eu acredito em acasos. a minha prima que está em nova iorque conhece estes miúdos. são, talvez, vizinhos, já lhes preparou refeições no restaurante onde trabalha. ou melhor, são vizinhos. eles não sabem, mas entre o meu banco e o deles existe um nome. palmira. porquê? porque os acasos existem, porque o mundo é pequeno, porque acredito mais na minha imaginação do que no meu país.

quinta-feira, agosto 22, 2013

s.t.

há um tiroteio de palavras, imagens, personalidade nas veias do sangue. daquela pessoa. desta pessoa. eu luto contigo. tu lutas comigo. todos lutam com todos. cansamo-nos. das regras. do passado. do que foi e do que não foi. apetece-me alvejar-te. e alvejá-lo. e alvejar-me. e, depois, fugir. como um assassino que limpou as provas do crime e vai jogar joguinhos com polícias, e saber que sairá impune. porque nunca tropeçou no destino. estou indisposta com as regras do jogo. estou-me nas tintas para o destino. não concordo com nada. nada concorda comigo. estou com a corda pendurada eo pescoço. incomunicável.

sexta-feira, maio 24, 2013

Fizemos o caminho até Santiago e felizmente ficámos “quilhadas”

Quando me levantei da cama só queria voltar a deitar-me. Sentia-me enjoada, doía-me a cabeça e o cheiro das meias mal lavadas provocava-me vómitos. Na casa de banho, no primeiro xixi do dia, sangrava-me um pensamento
Hoje não vou ser capaz
Do lado de lá da porta da casa de banho, a Lila vestia uma t-shirt e uns calções e apertava o dedo mindinho do pé numas sapatilhas recentes, próprias para enfrentar guerras montanhosas. Ainda sentada na sanita, a ouvir a agitação organizada da Lila, ocorria-me um verso
Ama como a estrada começa.Eu vou conseguir,
dizia eu dentro de mim. Mas o meu corpo traía-me. Na altura de puxar o autoclismo, a guerra entre corpo e mente era insuportável. Saí da casa de banho. A Lila deu-me bons dias. Disse que eu era forte e que não tinha dúvidas que iria conseguir. Enfiei a roupa. E com cada movimento fiquei mais convicta que, daí a instantes, o meu corpo diria à mente quem é que mandava. A Lila insistia que o pequeno-almoço iria reforçar o meu estado de alma. O meu estado de alma estava incrédulo. Às 7h30, uma miúda espanhola mal-humorada atirou um café com leite e torradas com compotas para a mesa. Queríamos comer antes de sair do hotel. Hotel? Eu estava no Caminho de Santiago. Eu não queria andar de carro e muito menos ficar num hotel. Comi metade. Fui sentir o hálito da manhã. Aliviei. O senhor que ia deixar-nos no albergue chegou, traído pela tatuagem da almofada na cara. Também mal-humorado. No dia anterior andámos 30 quilómetros de Tui a Redondela. Quando f-i-n-a-m-e-n-t-e chegámos, o albergue estava ‘lleno’. Cansadas, de estômago vazio, tomámos a decisão de ficar numa espécie de pousada: o senhor traído-pela-tatuagem-da-almofada-na-cara veio buscar-nos e, no dia seguinte, deixou-nos exactamente no sítio onde nos tinha encontrado. No carro, o homem-traído-pela-tatuagem-da-almofada-na-cara parecia um motor de arranque a falar: “El calor, el calor, mucho calor, 40 grados.” Eu com 40 graus de nervos e a primeira contracção de vómito. Começámos a caminhada. “Ok, eu sou capaz, eu amo como a estrada começa. Eu vou conseguir.” A Lila: “Tu és capaz, tu vais conseguir.” Eu: “Já sei! Preciso de sumo de laranja.” Já de mochila às costa a inaugurar o segundo dia de caminhada, tropeçámos no Máscara, um café com sumo de laranja natural. Melhor. Aliviei a cabeça. O estômago relaxou e eu assinalei o Caminho de Santiago com o meu vomitado. Deselegante. O meu dia só começou aí. Sentia a natureza pelo nariz. O bosque abraçava-me, quebrado pelo murmurinho de passes gigantes e barulhentos. O senhor sem nome aproximava-se de mim e da Lila, arrastando a mulher atrás que, por sua vez, tentava enganar o cansaço.
— Hola! Que tal? — (Ok, mais portuñol hoje.) — Bien! Que tal? — Bien! Tienes algo mal? — Ah, bien… o dedo mindinho [da Lila] está pisado (no meu melhor português). — Ah, portuguesas! Nós também! Já vimos desde Porriño… mas começámos em Ponte de Lima, de onde somos. — E vocês? — Nós começámos em Valença! — Estamos com a minha irmã e o meu cunhado… Vêm aí atrás… quilhados! Adeus!
Eu e a Lila rimo-nos com o corpo inteiro. Soltei uma gargalhada do fundo de mim. A partir desse momento a palavra quilhado encriptou as nossas conversas.
7.8.12 – começa a viagem dos pés até Santiago
No comboio antigo, eu e a Lila sentámo-nos na quinta fila viradas para o sentido da viagem. Apertadas com as banhas das mochilas. Falámos dos trilhos das nossas vidas. Dos poemas que almejávamos construir no futuro e o quanto precisávamos do caminho para seguirmos em frente. Do lado de lá do comboio a paisagem estava pintada com tons bucólicos e cheirava a maresia. Fazíamos a berma de Caminha, Vila Nova de Cerveira, a berma onde acaba a terra e continua o mundo no segredo do oceano. Tive fome. Saquei de uma maçã. Primeira dentada e yyeeccc… toda podre. Uma enorme risada. A viagem demorou mais de duas horas, mas passou rápido. Quando pinchei para a plataforma eram 18h20. Senti uma ou outra borboleta na barriga. Afinal, é assim que se estreia uma aventura. Começámos ali – na estação de Valença - o Caminho de Santiago com a mochila às costas. A segunda vez para as duas. A primeira vez, juntas. Atravessámos a ponte de Valença para Tui e surgiu a primeira aparição de uma paisagem bela. E o primeiro peregrino, o qual nunca soubemos o nome – no caminho conversa-se e conhecem-se as pessoas não os nomes -, mas que viríamos a tirar uma fotografia com ele e a dar um dedo de conversa. O primeiro albergue foi o de Tui. E dos poucos em que conseguimos uma cama. Dão-nos um género de forro para o colchão e para a almofada e depois o saco-cama faz o resto. Comunidade. A palavra que melhor descreve o ambiente e a vida dentro dos albergues dos peregrinos. E dos ginásios. Quando não há cama nos albergues, há colchões e duche nos ginásios. Em Pontevedra – terceiro dia de caminhada, eu e a Lila fomos encaminhadas por cinco euros para o ginásio mais próximo (um quilómetro). Lotado. O Caminho de Santiago está efectivamente internacionalizado. É bom e mau. De facto, o Caminho é de todos. Mas depois existe todo um comércio à volta que poucos sabem manter genuíno. Um dos poucos que sabe fazê-lo é o José do café em Padrón – última etapa da caminhada. Recebeu-nos de braços abertos, com um beijo na testa e uma fotografia de recordação — e tivemos de carimbar o caderno preto das suas memórias dos peregrinos. É quase como que uma caderneta com todos os cromos aventureiros que por ali passam. É um registo de gente feliz que quer viver a vida. Senti-me especial quando o José beijou-me a testa e desejou-me que os desejos da vida fossem sempre desejados, para assim serem concretizados. Esta foi a última noite antes da chegada a Santiago.
Último dia de Caminhada
Partimos ainda nem 7h30 o relógio marcava. Estávamos verdadeiramente felizes, tão felizes, que foi o único dia que choveu como que lágrimas da nossa felicidade, bênção da nossa peregrinação interior. Não sei se foi da neblina, do cansaço ou do facto de ter deixado de haver setas amarelas. Perdemo-nos. E aí percebemos que o nosso sentido de orientação é nulo. Subimos a montanha. Subimos. Subimos. Subimos. Para depois descermos. Descermos. Descermos. Graças a uma senhora muito engraçada que tinha dois cãezinhos como companhia, conseguimos retomar o caminho. Disse-nos que não estávamos no Caminho de Santiago. E levou-nos com uma bengala na mão até ao local onde tomámos a decisão errada ao virar à direita e não à esquerda.
Finally Santiago!
Chegar. Foi quase como virmo-nos. Ter um orgasmo. Depois de suar, rir, chorar e trespassar todas as etapas do Caminho, alcançar Santiago, foi uma verdadeira ejaculação. Primeiro, andámos aos solavancos, ombros contra ombros. Rodeadas por demasiados turistas. Apertos. À medida que caminhava sentia-me num palco. Agarrei a Lila pela mão e fiz como se estivéssemos a dançar. Porque estávamos em festa. E quando se está feliz e em festa, dança-se. Os nossos corpos rebolaram dançantes até ficarem caídos diante da catedral de Santiago. Silêncio. Cá dentro. O sabor da vitória levantava pó dentro de mim. Eu e a Lila enfiámo-nos, cada uma, no seu caderno. A sós com os nossos segredos. Santiago é assim: um segredo a céu aberto.

quinta-feira, maio 23, 2013

do medo

às vezes alguém acorda de manhã e não tem nada na cabeça. é um vazio. acontece muito por esta altura em que todas as cabeças estão ocupadas com muita coisa que nada tem a ver com aquela cabeça vazia. então os bons-dias são rápidos, fugazes, muitas vezes fugidios.
deixa ver se ela não me vê para não perder tempo com cumprimentos
é verdade o tempo corre, e cansamo-nos tanto a correr também atrás dele. também acontece acordarmos de manhã e termos a cabeça cheia. cheia de merda. títulos gordos dos jornais. insónias que nos lembram que o copo está, ao mesmo tempo, meio cheio e meio vazio. eu tenho a cabeça como o copo, ora cheia, ora vazia. e entre uma coisa e outra um medo. um pequeno medo em ponto cruz com a pequena dor.
aquela da canção
medo de amanhã não poder fazer o que gosto. o que faz acordar todos os dias. não ser como aquelas meninas bem vestidas das capas das revistas que são privilegiadas porque a flecha do cupido lhes acertou. oiço tantas estórias. acredito em algumas linhas. não quero ser capa de revista, e quero vestidos à minha medida e ao meu gosto. sobretudo, quero acordar de manhã e ter a certeza que vou continuar a fazer o que gosto. mas há sempre 'ses'. e há um se que me distrai. um será que me desorienta. e as mãos levantam-se vazias. a tentar agarrar o futuro. que anda por ai algures. não sei se me a fintar. um medo que nao me larga.
quem tem cu tem medo
tenho vida à minha frente. o medo de não ser a pegar nas rédas do cavalo para ir de cabelos longos à solta, a fazer o que quero. alguém disse
o cavalo passa desmontado uma vez por nós, se passar a segunda já vai montado
a luta. de todos os dias. de acordar e levantar. a luta da coragem. a luta com o divino. a luta do medo.

quarta-feira, maio 22, 2013

da vida

quatro beijos. dois nele. dois nela. e depois tudo o que quisesse era meu. a casa, as favas, as batatas, o presunto, o sumo, e até um quarto.
a menina vem para cá e eu trato-lhe de tudo
um mimo. aos 81 anos alguém dizer-me que me tratava de tudo [quando era agora a vez de alguém lhe tratar de tudo]. porque nunca pode tratar de ninguém. convidava-me assim a ser a filha que nunca teve. aquilo que nunca tratou. o desgosto que a vida lhe deu. viu-me pela primeira vez. não me conheceu defeitos nem qualidades. mas queria tratar de mim. e no fundo, por vezes, bem precisamos de um colo inesperado para desabafar sem falar, olhar sem dizer, contar sem falar. eu bem quis deitar-me naqueles 81 anos, ser tratada sem perguntas, esquecer-me das pessoas más, e agarrar-me aquele sorriso que me diz que há pessoas boas.

quarta-feira, maio 15, 2013

de manhã há um nevoeiro que persiste. e impede-me de visualizar os quilómetros que os meus pés já percorreram. trilhos sinuosos, altos e baixos, com sol intenso e chuva dura. e eu continuei a caminhar. a favor do vento. contra o vento. mas ...nunca parei. nem mesmo quando salpicos de sangue rompiam a roupa. mas, por vezes, há um nevoeiro que se acomoda e não me deixa ver tudo o que sou. mas sei, do fundo de mim, tudo o que preciso fazer é inspirar e expirar. porque quando o ar sair, sacode a bruma do nevoeiro. e nesse momento, entre um sopro e outro, eu vou ver, quem sou. o meu passado, presente e futuro. o que quero e o que não quero. as minhas cores, formas, o meu chão e o meu céu.

terça-feira, maio 07, 2013

falta um dente no sorriso do pastor. estende a mão num cumprimento alegre e apertado como a simpatia. "a menina...menina, porque para mim, todas as mulheres são meninas desde o dia em que nascem até ao dia em que morrem...a menina tem antepassados judaicos. tem olhos claros". atrás de agostinho monteiro, cabras e ovelhas, centenas, saltam agitadas de um lado para o outro na lama de palha. no meio da exploração há uma banheira cheia de água da chuva, onde o porto bebe com a língua de fora - como os cães saciam a sede. "dou nome de cidades aos cães, porque fui emigrante". coça a testa, recua no passado e continua: "andei pela frança com passaporte de coelho. sabe o que é um passaporte de coelho? antes do 25 de abril íamos pela noite para fora do país, trabalhei lá na citroen. regressei, felizmente, e para me lembrar do nosso portugal pus nomes do nosso porto, da nossa lisboa, do nosso mondego aos cães" - guardadores do rebanho. bem, senhor agostinho, agora os pastores são obrigados a cumprir obrigações fiscais. o que pensa sobre isto? tem rendimentos que justifiquem esta nova medida? "tenho 80 anos, uma reforma de 250 euros, centenas de cabras que vão parir no monte, eu tragos as crias às costas, fodo as costas. só se lembram dos pastores com o cabrito na mesa. quando os pastores deixarem de existir, deixa de haver comer na mesa. e depois perguntam: onde há pastores? há muitos a desistir disto por causa deste país pobre e porco, que trata com miséria quem lhe dá tudo". os olhos do pastor agostinho são claros o que me leva a pensar que também ele tem origem judaica. "jesus foi o primeiro comunista na terra. queria plantar o bem. dar educação e saúde a todos". por momentos penso que eu e aquele pastor partilhamos a mesma árvore genealógica.

quarta-feira, abril 24, 2013

[s.t.]

Hoje pus o amor fora de portas a dormir Como se faz com um gato intrometido. Hoje não me apetece regar o amor. Pu-lo a dormir lá fora, ao relento no tapete de entrada à porta de casa . Apontei-lhe o indicador e repreendi-o. Hoje não lavei o amor. Mandei-o embora. Mandei-o aquela parte. Para mim o amor asfixiou-se no céu preto e brilhante da noite. O amor hoje perdeu rebolou pela rua caiu da ponte. Hoje virei a cara ao beijo do amor. Bati com a porta. Bati com as costas. Bati com a vida na cara do amor. Escrevi ‘a’ em letra pequena. Ergue-se a manhã, com luz com sol. Estendem-se ingratamente no novo dia, o céu grande, azul. Abri a porta. E no tapete, a rastejar estava o amor. Fiel como um cão a pedir, clemência.

sábado, março 02, 2013

Conversas de Tricot

o contrato Ela era enfermeira e o marido também. Aos 42 anos o marido teve um avc e entrou em coma. Os olhos dela abrem-se e a luz do dia entra toda. Pára de recortar o papel para recordar o que já lá vai para lá de 20 anos. Toda a gente me dizia, prepara o funeral. A urna estava comprada. As missas encomendadas. As lágrimas entravam em cena. Mas eu não me acreditava. Um filho de 16 anos. Eu já não tinha mãe. Tinha 40 anos. Não podia ficar sem marido. Tão nova, tão desamparada. Na flor da idade, no auge das nossas vidas. Um suspiro. Uma pausa para acertar com a tesoura. Ai que estória de amor a nossa. Conhecemo-nos no hospital. Eu tinha acabado de receber uma carta de angola do namorado a quem estava prometida. Ele acabara de acabar comigo. Por carta de angola. Do ultramar. Eram traumas, percebe? Eu triste. A minha mãe morreu de desgosto. Dois suspiros. Pausa para acertar com a tesoura no papel. O meu marido entrou ao serviço. Disse-lhe logo, não tenho tempo para brincadeiras. Ou é sério, casamento. Ou então, não, fico sozinha. Ele disse que é sério, casamento. Seis meses, casamento. Tudo seguido. Para não perder tempo. A tesoura foge. Alinha papel. Corta novamente. Ai filha, o que passei. Quatro meses em coma. Tudo a dizer-me, vai morrer. Eu enfermeira. Eu a saber. Eu religiosa. Fiz um contracto. Isto está ficar mal. Acerta papel. Acerta tesoura. Começa de novo. Com a nossa senhora. Ou morre de uma vez ou um sinal para saber se vai viver. O homem, 42 anos, enfermeiro, pai e marido. Avc. Abre um olho, caí uma lágrima. O sinal. Que mais queria eu de sinal. Nossa senhora cumpriu. Cancela urna. Médicos balançam no sinal. Lágrimas entram em cena. Desta vez emoção de alegria. Está a ficar bem este desenho recortado. Pode ficar melhor. Troca tesoura. Sai do coma. Mãe e filho saem da agonia. Nossa senhora. A fé. Os médicos confusos com a fé e a ciência. Homem, 42 anos, avc, coma. Vive. Sem fala. É o menos. Tenho marido, tenho filho. Já está, ficou bem. O papel recortado. A tesoura pequena serviu. Viajamos. O filho casou. Há netos. A vida é-me muito boa. Nossa senhora. Sequelas. O meu marido fala do túnel, de experiências de quase morte. Esteve morto. Afinal. Mas o contracto. A nossa senhora. “Nossa”.

sexta-feira, janeiro 04, 2013

hoje apetece-me sentar no último degrau da escada. apetece-me esvaziar a catedral do meu corpo, e refugiar-me no armário da alma. apetece-me fugir do horizonte. estar virada do avesso. desejar nada. estar no trapézio sem rede.