um weblog sobre literatura, viagens, momentos, poesia, sobretudo, sobre a vida. enfim, um weblog com histórias dentro.

sexta-feira, junho 12, 2009

Crónica de um Amor à venda

Saíste-me cara, tu. Fizeste a mala e deixaste-me o odor de todos os lençóis gastos em filosofias angustiantes de um prazer adiado.
Não restou uma unha tua roída, caída ao chão, abandonada.
Foste embora. E foi isso. Empacotaste roupa, objectos e memórias. Levaste contigo todas as sinfonias. Não tive herança. Apenas uma placa colada na janela da frente, onde se lê: “Amor à venda”.
Procurei-te em todos os recantos de uma casa cheia de nada. Foste embora e contigo foram todas as memórias. As lembranças sumiram-se dos metros quadrados da habitação recheada de vazio. Restou a ausência. A tua. E com ela convivo. Trato-a bem. Afinal, tu és ela - a ausência.
Acordo com o hálito podre da tua falta. Deito-me enroscado na tua saudade.
Permaneço viciado naquele canto do armário onde tu guardavas a tua mala. Busco alguma memória que não tenhas enfiado na bagagem do carro. E agora meteste-te ao destino. E criaste a metamorfose que me consome e vicia. Sou capaz de ausência e nada mais. Abraço-me a mim, que é o mesmo que abraçar o nada. Tu és nada. És a ausência. A ausência vestida de dor.
Ontem percebi por que razão as pessoas se suicidam: não é por falta de, mas por excesso de. Excesso de ausência. Excesso de ti. Devias ter empacotado tudo. A tua ausência também. Metias na mala escura a saudade e o teu hálito podre. Deixavas-me sossegado. Ias embora sem fazer o mínimo de barulho.
O problema é que fizeste ruído ao bater com a porta. Uma pancada forte. Ainda sinto no coração. Está trémulo. Resiste, é verdade. Mas continua em estado de choque porque nunca se bate com a porta, nunca se faz ruído ao sair de casa. Há sempre aquela remota hipótese de os vizinhos acordarem, haver um enfarte, sei lá.
Eu preocupo-me, sabes. Não gosto de enfartes. Mas gosto de memórias. Foste má. Lançaste-te ao destino. E agora ocorre-me que também me levaste contigo. Sim, só agora. Fui junto com as memórias. E isso dói-me. Não devia ter ido. Dói-me e comove-me. Dói-me porque me tratas sem pudor. E, depois, comove-me, porque me queres lembrar.
Pois, eu sou mais do tipo apagar. Erase. Pareço uma gaja, deves estar a pensar. 'Não aguenta uma pancadinha no coração e fica logo logo trémulo'. Já não me recordo quem disse, mas pelos vistos os homens podem apanhar certas e determinadas estirpes femininas e vice-versa.
Agora tenho o coração a arejar. Entra por lá ar. Por acaso nem me agrada. Mas foste tu quem me ensinou: arejar. E como sempre te fui obediente, cá estou arejar, sôfrego na tua ausência, fiel à tua saudade, agarrado à tua aparição.

quarta-feira, junho 03, 2009

Melros

A P. disse-me: "se vires melros de bico amarelo significa boa-nova".
E eu digo: Há males que vêm por bem. Ou assim quero crer [já que vi três melros de bico amarelo, e duas das 'novas' não foram boas].

segunda-feira, junho 01, 2009

De facto,
quem é pequenino é pequenino
e quem é grande é grande
mesmo que não seja Grande.