um weblog sobre literatura, viagens, momentos, poesia, sobretudo, sobre a vida. enfim, um weblog com histórias dentro.

quinta-feira, dezembro 06, 2012

os corações efeitos-borboleta

é miserável pensares que os corações (sobre)vivem isoladamente. é mentira. uma verdade comprada. não há ditado mais mentiroso do que aquele que prega 'longe da vista,longe do coração'. o mundo é mudo em palavras, mas recheado de imagens, conta a estória verdadeira desta vida - os corações não andam sós. são ímans, são efeitos-borboleta. batem de um lado e causam intempéries do outro lado do peito. o coração da dona maria é um vendaval. o coração da filha da dona maria é um lago com cisnes a boiar. mãe e filha, separadas por anos de muitos relógios, doenças daquelas tão feias que não deviam existir. alguém disse, 'até um relógio parado, está certo duas vezes por dia'. ponto de encontro. acertaram os ponteiros e (re)encontraram-se. um abraço constrangido por lágrimas. uma teia só desenvencilhada por Deus. somos barcos à deriva. e os corações. esses apesar de sós, nunca andam sós. bate de um lado, vendaval do outro. é esta a verdade deste mundo.

quinta-feira, outubro 11, 2012

o jornalismo

ando com as palavras anoitecidas. preciso de páginas em branco para perceber o que tem acontecido. para madrugar os pensamentos. estou com os sonhos de criança tingidos. sinto-me só na minha profissão. sinto que a minha profissão está à deriva. dizem que os jornalistas são colaboradores. que a tinta está cara. e que o melhor é atirar tiros às pessoas que escolheram o jornalismo, que escolheram ser felizes. as crianças no meu tempo de criança queriam ser tudo o que não são hoje. porque naquela época não imaginavam o futuro. nem davam importância ao que queriam ser. eu sabia. eu quis desde que me conheço ser jornalista. e é um grande privilégio sê-lo. para dar voz a quem não consegue gritar. para espelhar uma sociedade no trapézio da vida. de repente. cresço. e há uma sensação preocupante e séria em torno do jornalismo. há uma tendência para algemá-lo. calá-lo. há aqui uma tentativa de homícidio. não foi por isto que me apaixonei. o jornalismo ensina a liberdade. evoca a liberdade. grita o grito. eugénio de andrade disse num verso que é urgente o amor. é urgente insurgirmo-nos. é urgente desamarrar. é urgente lembrar de onde vem o jornalismo para sabermos quem é ele. é urgente respeitar o jornalismo. não pode ser isto, o jornalismo. não pode ser despedimento. nem colaboradores. é urgente recordar a paixão do jornalismo. os seu valores. é urgente fazer jornalismo.

segunda-feira, outubro 08, 2012

os sonhos de criança chegam tingidos à idade adulta.

segunda-feira, setembro 24, 2012

começou o outono. apercebi-me pelo cheiro que emana das árvores.nem tanto pelo calendário. os meus cabelos voaram esta manhã como já não voavam há muito. eu gosto do verão. mas também gosto de ficar do lado dos mais pobres e dos mais fracos. ou seja, do outono. o outono perde nas estações do ano. até mesmo para o inverno. o outono vive precisamente entre a alegria do verão e a tristeza do inverno. muitos pensam que a tristeza do inverno começa no outono. mas estão todos enganados. o outono tem charme e é meigo. serve de psicólogo - começa uma sessão de preparação para tempos menos bons. eu gosto do outono, e eu sei, eu sei, que ele gosta de mim.

sábado, julho 14, 2012

T. queria espetar uma faca na alma. mas isso não mataria o arrependimento. T. queria ser uma serial killer de corações despedaçados. só para poupar a dor prolongada de uma doença sem cura. Saíu de casa, louca, com os cabelos a fintar o vento, e correu. correu relógio fora. apenas para esquecer os desarranjos da alma. na esperança de alcançar o inesperado. que tal como a alma, é imperfurável. o arrependimento é imperfurável.

sexta-feira, julho 06, 2012

adeus

quando conheci a sãozinha não sabia que seria minha avó para sempre. nasceu já velha para mim. eu no início da vida. ela com cabelos brancos e pele enrugada que teimava com todos os tempos. uma mulher do campo, forte, resmungava por tudo e por nada, e por tudo e por nada dava gargalhadas - muito altas. só me apercebi destas características quando ganhei consciência. os meus avós moravam na rua do casal e a sãozinha também. muito conveniente para me deixarem de manhã antes do trabalho. eu era o trabalho de sãozinha. todos os dias pelas 07h30 a porta da casa mais velha da rua, da senhora mais velha da rua, rangia. e eu também, porque via a minha mãe e a minha avó irem para o trabalho. amar custa. o tempo foi passando, o meu tempo também, e certo dia em que dei folga à sãozinha, apercebi-me que a amava. e ela a mim. a partir daí, sãozinha mudou a semântica e semiótica da palavra e imagem sãozinha. passou a ser a avó, e o marido avô. os outros netos primos, os filhos tios. mais do que família, sãozinha para mim reflecte uma boa parte do meu ser, e do meu lugar do mundo. gosto de feijões pela teimosia da avó sãozinha. não tenho medo de cães nem de gatos, porque corria o campo todo em liberdade. aprendi que o vinagre faz milagres. aprendi a rezar e a dar graças - ou não fosse a avó sãozinha a mais antiga catequista de Rio Tinto. sobretudo, deixava-me brincar com martelos a fingir que eram microfones, e punha-se a rir das minhas figuras. um dia sãozinha perdeu a memória. ficava admirada de me ver dizer que eu era a joana, a joaninha, a neta de nenhum filho. depois arregalava os olhos e dizia: espera lá, a joana é pequena com uns grandes olhos azuis. "tu és ela?" a minha avó sãozinha parou as memórias no tempo delas. e fez bem. a palavra adeus é longa. tem 30 anos de existência.

quinta-feira, março 29, 2012

andar de autocarro é maravilhoso. vê-se a cultura na sua forma humana. a poeira de palavras e conversas atravessam todos os ouvidos. mesmo os mais distraídos.
uma senhora que queria ter saído numa paragem que ficou lá atrás. o motorista que faz ouvidos moucos ao tombar da leveza do corpo humano. as flores na mão da rapariga a tirar fotografias com os olhos. é maravilhosa a simplicidade da vida. isto sim são estórias. aquelas que deveriam apanhar o autocarro das 8h.

segunda-feira, fevereiro 27, 2012

um vislumbre.

um vislumbre.
o dia acorda com luz do céu.
raios que correm janelas. que correm cortinas. que correm corpos cambaleantes das manhãs.
um vislumbre.
uma luz que escreve na testa 'há-uma-probabilidade-acima-do-4º-andar-desta-coisa-dar-certo'.
um vislumbre. sem esperança. a esperança é frio num dia de sol.

quarta-feira, fevereiro 15, 2012

F. está a viver a vida a preto e branco.
com muitos pontos finais.
poucos parágrafos.
muitas vírgulas.
muitos pontos de interrogação.
no espelho um reflexo: zombie.
tudo a preto e branco.
mais sombra que luz.
à noite lê crime. de manhã romances.
não há intervalo.

sexta-feira, janeiro 20, 2012

há manhãs que não deviam acordar.
há dias que não deviam existir.

"desconfio que se disser mar em voz alta, o mar entra pela janela"
AL BERTO