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terça-feira, maio 07, 2013

falta um dente no sorriso do pastor. estende a mão num cumprimento alegre e apertado como a simpatia. "a menina...menina, porque para mim, todas as mulheres são meninas desde o dia em que nascem até ao dia em que morrem...a menina tem antepassados judaicos. tem olhos claros". atrás de agostinho monteiro, cabras e ovelhas, centenas, saltam agitadas de um lado para o outro na lama de palha. no meio da exploração há uma banheira cheia de água da chuva, onde o porto bebe com a língua de fora - como os cães saciam a sede. "dou nome de cidades aos cães, porque fui emigrante". coça a testa, recua no passado e continua: "andei pela frança com passaporte de coelho. sabe o que é um passaporte de coelho? antes do 25 de abril íamos pela noite para fora do país, trabalhei lá na citroen. regressei, felizmente, e para me lembrar do nosso portugal pus nomes do nosso porto, da nossa lisboa, do nosso mondego aos cães" - guardadores do rebanho. bem, senhor agostinho, agora os pastores são obrigados a cumprir obrigações fiscais. o que pensa sobre isto? tem rendimentos que justifiquem esta nova medida? "tenho 80 anos, uma reforma de 250 euros, centenas de cabras que vão parir no monte, eu tragos as crias às costas, fodo as costas. só se lembram dos pastores com o cabrito na mesa. quando os pastores deixarem de existir, deixa de haver comer na mesa. e depois perguntam: onde há pastores? há muitos a desistir disto por causa deste país pobre e porco, que trata com miséria quem lhe dá tudo". os olhos do pastor agostinho são claros o que me leva a pensar que também ele tem origem judaica. "jesus foi o primeiro comunista na terra. queria plantar o bem. dar educação e saúde a todos". por momentos penso que eu e aquele pastor partilhamos a mesma árvore genealógica.

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